Archive for Dezembro, 2009

10 sugestões de tuíte no sexo para ele e para ela

31/12/2009

Primeiro e acima de tudo, amigas e amigos: muito obrigado por tantas coisas boas que me trouxeram em 2009. Fazia tempo que eu não ria tanto ao escrever. Desde os primeiros tempos da VIP. Que 2010 traga a todos paz, saúde, o dinheiro necessário, mais risadas que lamentos, e bons momentos sentimentais.  Deixo aqui uma música que me é cara, de 1973, em que a guitarra de George Harrison passeia pela melodia que ele deu para Ringo Starr colocar num disco pós-Beatles. Now I wanna tell you the pleasure really was mine, diz um trecho. Digo o mesmo a vocês. E agora aos tuítes sugeridos:

Ele 1) “Quem sabe na próxima?”

Ela 1) “Quem sabe na próxima?”

Ele 2) “Acabou?”

Ela 2) “Acabou?”

Ele 3) “Por que fui lembrar da minha avó agora?”       

Ela 3) “Por que fui lembrar do meu pai agora?”

Ele 4) “O Corinthians ganhou?”

Ela  4) “A novela já começou?”

Ele 5) “Todo mundo tem um mau dia.”  

Ela 5) “Será que ele tá sempre num mau dia?”

Ele 6) “Se eu gemer ela vai acreditar que tá bom pra mim?”

Ela 6) “Esse gemido tá parecendo um latido.”

Ele 7) “Tomara que ela não saiba que homem também finge.”

Ela 7) “Parece teatro, os dois fingindo, hahaha!”

Ele 8 ) “Ela tinha que  gritar tanto assim?”

Ela 8 ) “Será que ele acorda com grito?”

Ele 9) “Nunca tinha me acontecido antes. Sério.”

Ela 9) “Só meu vibrador não falha.”

Ele 10) “Que no Ano Novo eu tenha mais sorte!”

Ela 10) “Que no Ano Novo eu tenha mais sorte!”

Tuitar no sexo é uma arte para poucos

30/12/2009

JÚLIO CONHECEU LÚCIA NO TWITTER. Ela o retuitou numa frase de George Orwell que ele postara´: “Todos os animais são iguais, mas alguns são mais iguais que os outros.” Depois retuitou-o novamente numa frase de Woody Allen: “Só me arrependo de não ter feito tudo diferente na vida.” Na terceira tuitada ele decidiu mandar uma mensagem direta para ela. Era uma frase dele mesmo: “Tuitar no sexo é um arte para poucos: envolve perícia, astúcia e senso de oportunidade.”

Não há nada mais fácil do que passar de uma relação virtual para uma relação real. As pessoas online anseiam por um contato com alguém a quem, se esticarem o braço, possam tocar. Júlio convidou Lúcia para um café. Foram a um Starbucks. Reconheceram-se logo não apenas pela foto, mas porque ambos haviam levado seu laptop para um atraso eventual do outro. Ficariam tuitando na espera. Os dois estavam na casa dos 30. Ele era repórter, ela documentarista. Ele gostou do sorriso dela, e do decote também. Ela gostou do humor dele, e do laptop também. Ela consultou seu twitter apenas uma vez. Ele duas. Como demoraram uma hora e meia no café, era sinal de que a conversa agradava a ambos. Na última vez que saíra, Lúcia chegou a tuitar em meio ao encontro. “Uma palavra: boring”, escreveu.

O próximo encontro foi no São Cristóvão, numa noite de sexta. Parecido em muita coisa. Nos laptops com que ambos chegaram, nas risadas, e até na contagem de consultas ao twitter: 2 a 1 para ele. As duas diferenças foram que tomaram vinho em vez de café e saíram não cada um para seu lado, mas para o mesmo lugar, o apartamento de Lúcia na Vila. Ali, ela falou de um filme que tinha amado, Reflexos da Inocência . Ele não conhecia. Ela contou a ele a história e disse que estava louca para fazer a cena da dança da música do Roxy Music. Ele topou. Ela deus as coordenadas, e então colocou alto a música, depois de ter passado maquiagem nele para fazer o papel de Roxy Girl.

Júlio não estava muito à vontade no papel de Roxy Girl, mas Lúcia arrasava. Era parecida com Felicity Jones, a atriz. E dançava e dublava com a mesma naturalidade com que tuitava.  Lúcia mexia os braços exatamente como no filme, com graça e destreza. Ensaiara no espelho muitas. Júlio ficou mesmerizado. Terminaram no sofá, um tirando avidamente a roupa do outro, ela molhada já mas com lucidezsuficiente ainda para tirar o som de seu Blackberry e pô-lo para vibrar, ele excitado e engraçado com a maquiagem. Júlio não pensou nem no twitter e nem nas preliminares, e entrou direto em Lúcia. Ela se contorceu, colocou os braços por trás da cabeça suada dele, berrou como Meg Ryan naquele filme, e mexia os dedos freneticamente, acariciando a nuca de Júlio com a mão de direita.

Ambos chegaram ao êxtase, a melhor cópula de 2009 para os dois, e se ajeitaram como dava no sofá estreito, ela com uma perna sobre ele e a cabeça sobre seu peito. Lúcia depois de alguns minutos disse que ia tomar uma ducha. Júlio disse que a esperava. Mal ouviu o som do chuveiro, ele correu sorrateiro ao laptop de Lúcia. Entrou no twitter, digitou sua senha e ia colocar uma frase de Júlio César, “vim, vi, venci”, quando levou um susto. Não, não era possível. Houve um erro no twitter. Um post de Lúcia, feito alguns minutos antes? Apertou os olhos para ver se era algum problema de visão. Não era. Era Lúcia mesma, e ali estava escrito que a mensagem fora enviada do Blackberry. “Tuitar no sexo é uma  arte para poucos: envolve perícia, astúcia e senso de oportunidade”.

Dez coisas que eu lamento que ocorrerão em 2010

28/12/2009

DEZ COISAS que vão acontecer em 2010 e eu lamento que assim seja:

1) As francesas irão para a praia e as piscinas, no verão, não de topless, mas até de burquini;

2) As mulheres colocarão silicone e botox e branquearão os dentes e tingirão o cabelo e farão a depilação brasileira e assim ficarão todas iguais;

3) As pessoas tuitarão no pré ou no pós-coito, e às vezes até durante;

4) As pessoas lerão Dan Brown e Paulo Coelho e não lerão Ford Madox Ford;

5) As pessoas seguirão celebridades no twitter e verão reality shows;

6) Os homens serão submetidos a maratonas extenuantes de preliminares;

7) As pessoas terão que engolir o horário eleitoral obrigatório;

8 ) Gente morrerá em ataques terroristas e jovens soldados voltarão para sua terra em caixão;

9) Casais farão palhaçadas no casamento e filmarão na esperança de criarem vídeos virais;

10) Menos livros, menos jornais e menos revistas serão lidos, e Kindles serão comprados por quem não lê.

23 Coisas Que Vou Fazer No Ano Novo

26/12/2009

EM 2010 eu vou:

1) Andar mais no parque, de preferência descalço na grama;

2) Comer mais devagar;

3) Ler mais poesia;

4) Tentar ficar menos zangado; raiva faz mal;

5) Rir mais;

6) Diminuir o consumo de carne;

7) Tocar mais violão;

8 ) Tentar meditar mais;

9) Tomar Nescau e sorvete de chocolate;

10) Viajar de trem;

11) Julgar menos;

12) Fugir de fofocas;

13) Tirar fotos;

14) Ver fotos;

15) Tentar pensar em coisa boa quando coisa ruim vier à mente: não sou obrigado a segurar maus pensamentos;

16) Jogar tênis e não apenas ver;

17) Jogar pingue-pongue;

18) Comer pizza de mussarela;

19) Tomar coca zero, mas também água;

20) Lembrar do meu pai;

21) Telefonar para minha mãe e cantar alguma coisa que ela goste e torcer para que ela cante La Vie En Rose;

22) Sentar à beira do rio;

23) Respirar mais fundo.

A pequena glória e a grande miséria do amor unilateral

24/12/2009

O amor uniteral é ríspido como um cigano búlgaroUMA DAS PIORES coisas que podem acontecer a um coração apaixonado é um amor unilateral. Há uma vasta escala no amor unilateral. A vítima dele pode encontrar, no ser amado, indiferença ou desprezo, e talvez seja este o melhor cenário no caos e no drama amoroso dos amores unilaterais. A absoluta ausência de resposta amplia mas ao mesmo tempo encurta o sofrimento. Nenhuma esperança é melhor que uma dose humilhante de esperança nas questões românticas.

Quando eu era adolescente, tive uma queda unilateral por uma loirinha da classe. Eu mais a escola toda, incluídos serventes e professores, e se não me engano o vendedor de cachorros quentes. Uma vez, liguei para ela. Estava trêmulo, meus dedos mal acertavam os números anotados num caderno e mais fortes ainda na minha alma, hesitei e afinal ouvi o sinal de que o telefone tocava em sua casa simples e germinada de menina de classe média de Pinheiros. Ela atendeu. “Sou eu, o Fabio.” A resposta massacrou minhas esperanças. “Que Fabio?” Se eu não era sequer o primeiro Fabio em sua agenda, que expectativas eu poderia ter?

Desliguei decepcionado. Era um interesse unilateral extremo, e isso, se não me permitiu sonhar acordado, ao mesmo tempo me fez riscar imediatamente aquele número de telefone de meu caderno e, mais importante, de minha alma. Uma moreninha que eu conhecera num mingau do Círculo foi bem mais receptiva, e tive com ela passagens que lembro vividamente ainda hoje, tanto tempo depois. Mais que tudo, o beijo numa pilastra no ginásio em que dois conjuntos tocavam alternadamente, um em cada ponta. Meu primeiro beijo de boca, gloriosamente interrompido por um segurança que zelava pelo bom comportamento dos adolescentes nos bailes de domingo no clube. Um toque nas costas, não forte o bastante para doer, mas nem tão fraco que eu pudesse confundir com uma explosão braçal dela. Fiquei orgulhoso. Se era algo que o segurança achara que devia brecar é porque era um beijo de verdade, embora, sinceramente, não lembre se pus língua para fora e nem se ela tirou a sua na busca da minha.

O amor unilateral, quando encontra uma resposta que não seja o desinteresse total, é cruel como um cossaco russo e ríspido como um cigano búlgaro. Vi um caso desses num filme a que assisti recentemente por sugestão da Srta K, 500 Dias de Verão. Antes de me estender uma observação: no capítulo homem e mulher se encontram e desencontram com diálogos e canções incríveis, não há nada que se compare a Annie Hall, de Woody Allen, e Harry&Sally, aquele em que Meg Ryan simula um orgasmo berrante numa lanchonete, uma cena clássica do cinema de todos os tempos.

Isto dito, é um bom filme, 500 Dias. Há nele instantes de alta inspiração. A cena em que o apaixonado vai a uma festa em que reencontrará a namorada perdida é brilhante no uso de duas imagens simultâneas. Numa delas você vê a expectativa dele, e na outra a realidade. O cara era vítima do amor unilateral em sua pior manifestação, aquela em que você comparece com 95% do amor do casal e ela 5%, e com isso você arrasta as ilusões muito além do razoável. O quadro que melhor ilustra essa situação é o seguinte: no exato instante em que você está imerso em lembranças românticas, ouvindo Tony Bennett cantar Stranger than Paradise, ela está rumo ao terceiro êxtase com um cara que Tony Bennett é uma griffe italiana.

E então o desiludido do filme sofre 500 dias, com pequenos lapsos de alegria, entre os quais o mais interessante é o dia seguinte ao primeiro sexo com ela, em que ele caminha pelas ruas como um super-homem, cumprimentando todo mundo, dando passos de dança. Se ela tivesse simplesmente rejeitado o cara, ele teria encontrado a garota certa, aquela do fim, muito antes. Ali ficou clara a possibilidade do amor bilateral, embora o filme termine antes do primeiro café que os dois tomam. Se não chega às alturas de Annie Hall e Harry & Sally, 500 Dias presta um serviço aos amorosos ao mostrar o abismo de dor que se encerra no amor unilateral em que um entra com quase tudo e o outro com quase nada, e é isso, pegar ou deixar.

Memórias de um tolo

21/12/2009

NUM FILME CLÁSSICO, Laura, um personagem se apaixona pela mulher que vê num quadro. É um policial, e a mulher era a vítima de um assassinato que cabia a ele investigar. Isso acontece de vez em quando, você ver alguma coisa e ficar com o coração batendo forte. Comigo, por exemplo. Vi outro dia no YouTube, por acaso, uma cena de um filme que sequer sabia que existia, Flashbacks of a Fool. É de 2008, e o papel principal é de Daniel Craig, o atual James Bond. A cena é uma recordação dele quando adolescente, percebi depois ao pesquisar o filme e ver o trailer.

A imagem de Laura fascina o policial no filme clássico

A imagem de Laura no quadro fascina o policial no filme

Toca uma música linda, que eu também desconhecia, do Roxy Music,  e o garoto apaixonado é conduzido a uma dança com dublagem pelo seu primeiro amor. When You Were Younger, cuja letra é simples e tocante, é a canção. Não me lembro de outra cena de filme tão bonita que eu tenha visto nos últimos anos. O trecho essencial da música:  Shake your hair girl with your ponytail/Takes me right back (when you were young)/Throw your precious gifts into the air/Watch them fall down (when you were young)/Lift up your feet and put them on the ground/You used to walk upon (when you were young. Balance sua cabeça com o rabo de cavalo, menina, e assim eu volto no tempo, numa tradução meia boca do começo. E por aí segue a letra, lírica e evocativa.

O diálogo naquela cena diz um bocado para mim e minha geração, que descobriu o mundo nos anos 70. Num determinado momento, ele pede a ela que escolha entre David Bowie e Brian Ferry, do Roxy Music, e ela diz que não é justo. Se fosse para escolher entre um deles e o Deep Purple, tudo bem. Mas Bowie e Ferry são ”deuses”, ela diz. Ela fala de Jean Genet e Burroughs, escritores malditos que naquele tempo eram avidamente lidos por jovens como os do filme, e eu mesmo.

Vi trechos do filme, caoticamente, no YouTube, mas vou ver se encontro o dvd. O diretor dá aqui algumas explicações. Pelo que percebi, é um cruzamento de Verão de 42 com Imensidão Azul. Craig faz um ator de sucesso que acaba vítima da bebida sem limites, e tenta buscar a redenção voltando ao passado, para o lugar em que viveu sua era da inocência e em que conheceu a garota que o fez ver o mundo sob um ângulo diferente. Sempre que vejo esse tipo de situação, volto a Gatsby, de Fitzgerald, e sua frase sublime final segundo a quem remamos todos contra a corrente, em busca dos dias passados.

Minha era da inocência, então, parece me cercar por inteiro. Papai, mamãe, meus irmãos, meus amigos, a esquina em que nos reuníamos, todos nós no esplendor que a memória garante. O futebol, a camisa do meu time, o uniforme da escola, o ônibus branco e azul, a placa do ginásio, o sorvete de chocolate no parque, o fusca vermelho do meu pai, o cabelo majestosamente protegido pelo laquê de minha mãe, o mingau. Os gibis do Fantasma, do Mandrake, do Superman, do Cavaleiro Negro, do Batman. Mancha Negra e Mickey, Maga Patológica e Madame Min. Hercule Poirot e Miss Marple, Pedrinho e Emília. Dona Isabel e Zé Verdureiro.

E ela. Olhos verdes, vestido azul e branco de escoteira, ela mesma, a quem um dia, muito tempo atrás, dei uma foto dedicada à menina de 15 anos mais linda que jamais existira, ela, exatamente ela, que fez o chão tremer pela primeira vez para mim, assim como a garota do filme que sequer vi, mas pelo qual fiquei obcecado como um tolo.

Ela está cansada de ‘relacionamentos 0800’ e pede socorro

18/12/2009

Fico impressionado com a qualidade dos debates amorosos que vejo nos comentários.  E na minha caixa postal percebo que não estou sozinho nessa avaliação. Me chegam histórias de pessoas em busca de luzes para uma fase de escuridão sentimental que não conseguem entender. Coloco aqui a carta de uma mulher do litoral à qual darei o nome de ‘Solitária Marinha’. Ela coloca seu problema, e de nós espera pistas para a solução.

Olá, homem sincero.

Tudo bem?
Bom, preciso de uma consulta nua e crua.
Fabio, quero entender pq estou há tanto tempo solteira. Solteira assim, sem relacionamentos sérios daqueles q normalmente a gente chama de namoro.
Panorama: tenho 33 anos, sou jornalista, moro em Santa Catarina e mantenho uma vida bem independente. Tenho vários amigos, adoro um chop e um bom papo, praia, livros e TV. Tenho 1,70m, 66 Kg (claro q preciso perder 2), que estão bem distribuídos. As marcas de ser balzaquiana com certeza aparecem, mas não tenho problemas com elas não.
O que acontece é q desde q terminei meu casamento, há quatro anos, estou solteira. Tenho até relacionamentos, o q chamo de 0800, daqueles q acontecem sem compromisso q só servem para manter a pele boa. Pq não viram namoro? Pq normalmente os caras têm compromisso ou moram em outra cidade.
Só que, ultimamente, estou me sentindo bem carente. Faz falta ter um companheiro e estar solteira não é uma questão de opção. É FALTA de opção. Qdo aparecem caras interessantes tem algum problema. Coisas do tipo:
– estado profissional: reposicionamento de mercado há dois anos (tecla sap: desempregado há dois anos);
– estado civil: recém separado do 18º casamento (tecla sap: mora um mês na casa da pessoa e separa);
– sexo: não faço, não gosto muito, sou ligado a algo superior (tecla sap: gay!!!!)
Já tentei a net, mas achei algo tão sem graça… Tão comercial q desisti…
Alguma sugestão p a minha situação??? Qual será o meu problema??? (já adianto, não tenho xulé, nem bafo…)
Quero algo mais, quero um relacionamento… Nem falo em casar, quero ter alguém para sair, viajar, rir, ver filme, tomar uma gelada no final de semana…

Está convocado o Conselho de Sábios Amorosos para ajudar a Solitária Marinha, que anseia por alguém que lhe proporcione não apenas êxtases efêmeros e rodopiantes, mas uma gelada à beira do mar e a possibilidade de um futuro amoroso à base de sexo, claro, mas também de camaradagem, cumplicidade e compartilhamento duradouro.

Mulher feia não tem vez na empresa: isso está certo?

16/12/2009

Anúncio da American Apparel: uns amam e outros adoram odiar

FAZIA TEMPO que eu não me interessava por uma revista impressa. Estou digitalizado no consumo de mídia, feliz ou infelizmente, e o papel ficou restrito, para mim, para a leitura de livros. Jornal, daqueles que mancham as mãos de tinta, já não sei bem o que é.  Em 2009, me conectei talvez até mais do que deveria. Mas, mesmo nadando na imensidão virtual, uma revista de papel me fez parar como nos velhos dias em que as páginas exerciam sobre mim uma fascinação quase que sexual: a Vice.

Gostei da audácia do projeto editorial, da beleza plástica do conjunto, das reportagens espirituosas. Não é toda publicação que tem coragem de publicar as fotos de Richard Kern, um novaiorquino que produz imagens tão eróticas que mentes mais moralistas e rígidas poderiam classificá-las como pornográficas. A boa revista está nos detalhes, e a Vice tem, por exemplo, uma pequena seção notável, os do’s e don’ts das roupas e atitudes contemporâneas.

É uma revista distribuída de graça nas lojas da rede de roupa American Apparel. Recentemente li sobre o dono da American Apparel, Dov Charney. Vi também uma entrevista concedida a uma emissora americana, e então entendi tudo. Charney é a explicação para a fórmula da Vice e da American Apparel, um caso extraordinário e rápido de sucesso no mundo dos negócios nos Estados Unidos. É um cara amado e admirado por muitos, e os demais adoram detestá-lo.

Vi várias vezes, num site, ele ser chamado de perv, pervertido. Isso porque ele tem em sua sala fotos de mulheres de topless, fotografadas por ele mesmo. Charney estimula em sua empresa uma cultura liberal, do ponto de visto do sexo. Muitas funcionárias posam para os anúncios provocadores da American Apparel, e com sua barba de fauno Charney não esconde que já dormiu com várias funcionárias. Num ambiente politicamente correto como os Estados Unidos, onde já não existem cegos mas sim deficientes visuais e nem negros mas afroamericanos, Charney demonstra uma coragem épica, talvez irresponsável até.

Ele foi apedrejado recentemente porque sua empresa não quer mulheres feias nos seus quadros. Há um impacto nos resultados, nos lucros, segundo se diz.  Não acho estranho. Não para uma empresa cujas empregadas posam seminuas para campanhas publicitárias. Preferência para bonitas no departamento de pesquisas avançadas de célula tronco Instituto Planetário da Salvação dos Casos Perdidos seria esquisito. Mas numa cadeia como a American Apparel faz todo o sentido. Beleza, neste caso, é fundamental.

Tenho uma pequena experiência para relatar. Passei na frente de uma loja e entrei para pedir um exemplar. Uma balconista bonita e delicada me passou um exemplar. Perguntei se não havia exemplares antigos, e ela disse que não. Eu já estava a uns 50 metros da loja quando vejo alguém correr em minha direção. Era a atendente, que encontrara uma edição velha e fez questão de me entregar. Havia nela uma graça esbaforida que tornou o meu dia menos frio.

Sem conhecer, gosto de Dov Cherney. Acho que é gente que contraria os ventos que empurra o mundo para a frente e nos liberta de um tédio sem fim.  Bem, gostaria de saber o que vocês pensam.

Os casais da década: Top 10

15/12/2009

Não é nada disso que você está pensando

Não é nada disso que você está pensando

São eles:

10) Carla  e Sarkozy. Pela primeira vez os franceses conhecem em detalhes o corpo da mulher do presidente. Voilà;

9) Madonna e Jesus. Quando Lady Gaga desafiou Madonna pelo título de Rainha do Pop nem Jesus salvou;

8 ) Lindsay e Samantha. O casamento das aranhas;

7) Berlusconi e Noemi. Como ele poderia resistir aos encantos naturais de Nápoles, catzo?

6) Paul e Heather. Três pernas, nenhuma carne e um divórcio caríssimo;

5) Angelina e Brad. Só vai perder a graça se o final for feliz;

4) Tiger e Cia Ltda. Como o cara arrumou tempo para ainda jogar golfe?

3) Roger e Mirka. Quando o excesso de peso não é problema para você chegar ao match point;

2) Michele e Barack. E precisa explicar?

1) Google e todos nós. Uma busca que, sim, sim, sim, foi boa.

Vocês me ajudam a ajudar um amigo?

13/12/2009

Um por todos, todos por um, no sol ou na chuva

JÁ QUE VOCÊS SABEM TUDO, conforme tenho percebido nos comentários, de artes marciais a comédias românticas, passando por ocultismo e meios de se antecipar a botas, isso para não falar em fastio pré e pós-coito, devem conhecer a frase do Montaigne sobre a amizade. Amigos, vou escrever de orelha, formam juntos um tecido tão único que você não consegue perceber a costura entre eles. É mais bonito que isso, mas este é o sentido. Montaigne, tão estóico, tão firme na filosofia que ensinava a suportar as adversidades, mergulhou numa ‘noite escura e fria’ quando seu maior amigo, La Boétie, morreu.

Um amigo meu pede ajuda. Como recusar?

Ele tem a tarefa, a missão jornalística de formar uma espécie de  mosaico dos anos 2000.  O que mais marcou a década em cinco categorias. Pessoas, como Obama ou Penelope Cruz; fatos, como a explosão das Torres Gêmeas; produtos e objetos, como o IPod; palavras e expressões, como rede social ou burca; e coisas culturais, como a série The Office.

Dez escolhas por tópico, o que significa, ao final, uma superlista com 50 coisas que definem a era que se encerra. É um exercício de edição duríssimo, mas fascinante.

Vocês me ajudam a ajudar meu amigo?

Mulheres atraentes detestam mulheres atraentes

12/12/2009

MEXO EM meus livros e encontro Casa de Encontros, do bom escritor inglês Martin Amis. Meio reacionário, mas um cara inteligente e provocador que vale a pena conhecer. É passado na Rússia sob a ditadura bolchevista, que sob Lênin prometeu o céu aos russos e com Stálin e sucessores entregou o inferno. A trama é um triângulo amoroso: o narrador e seu irmão disputam uma mulher sexualmente ousada, à frente de seu tempo. Um trecho me chama a atenção. O narrador diz para sua filha, uma mulher bonita: “Estou prestes a descrever uma jovem extraordinariamente atraente, e a experiência me diz que você não vai gostar, porque é isso o que você também é. E na minha experiência uma mulher atraente não quer nem ouvir falar de outra mulher atraente”.

Amis está certíssimo, como diria o superlativo agregado José Dias. No mundo ideal da mulher atraente, todas as outras seriam parecidas com a Susan Boyle.  A mulher atraente prefere ouvir um programa de rádio de uma hora sobre  futebol comandado pelo Juca Kfouri a suportar uma referência de segundos a uma rival na beleza.  Vibra mais com a desgraça de uma competidora do que com seus próprios triunfos. Examina com a severidade de um aiatolá a outra e enxerga nela instantaneamente todos os defeitos reais ou imaginários, do penteado ao esmalte, passando pelo sotaque e pelo prato que pede ou deixa absurdamente de pedir num restaurante. Condena com ênfase a igual mesmo sabendo-a inocente.

A mulher atraente é, com suas semelhantes, cruel como um cossaco russo e dura como um cigano búlgaro. Mais que frontal, ou rivotril, ou lexotan, ou mesmo a companhia promissora de um homem interessante, o que acalma a mulher a mulher atraente é a visão idílica, majestosa, incomparável de uma mulher-bomba, uma terrorista da estética e dos cuidados mais elementares com o corpo e os trajes. O ódio vai aumentando à medida que o tempo vai passando e a mulher atraente vai deixando de ser atraente, como vimos na entrevista que uma veterana jornalista inglesa fez com Belle de Jour, a abnegada e bem torneada cientista que teve que cobrar 300 libras por hora no sexo para poder pagar o doutorado com que tanto sonhara. Mas disso já falamos e discutimos em outro post.

É para protegê-la das demais mulheres atraentes em sua fúria assassina que a natureza fez que surgíssemos nós, os homens solidários e prestativos, cavalheirescos e gentis. Há uma sabedoria na natureza que me comove e me emociona em alguns de seus capítulos inspiradores. Ter-nos trazido ao mundo para defender a mulher atraente, vítima da psiquê fascinantemente agressiva das pessoas de seu próprio gênero, é um deles. Me faz pensar que há algum sentido na vida, ou pelo menos pode haver.

Fábrica de Anjos

10/12/2009

LEMBRO BEM A CENA, anos depois. Em geral, episódios assim são alegres. Mas não era o caso. Eu acabara de chegar ao pequeno e aconchegante apartamento de Júlia quando ela me contou a novidade. Estava grávida. Foi um acidente. Ela sempre usava diafragma. Quando estávamos a ponto de nos engalfinhar na cama, ela se levantava, caminhava no seu passo leve até o banheiro e, com a porta sutilmente entreaberta para que eu pudesse vê-la como se estivesse roubando a visão de uma cena intensamente erótica, colocava o diafragma. Uma única vez não colocou, porque estávamos ansiosos demais. Essa vez foi suficiente. Júlia engravidou sem que quisesse. Sem que nenhum de nós quisesse.

Não houve grandes dilemas. Na verdade, não houve nenhum dilema. Júlia, quando me avisou que estava grávida, já tinha o telefone de uma clínica de aborto. Uma amiga que fizera um aborto ali lhe dera o número. Ela apenas me comunicou que não iria levar adiante a gravidez. Nos amávamos, e muito, mas não era a hora. Na nossa vida, existem horas certas e existem horas erradas, e aquela era uma hora errada.

Lembro que ela estava convicta, ou assim parecia, ainda que seu olhos amendoados de mestiça de mãe japonesa e pai brasileiro traíssem tristeza. Os cabelos presos num rabo de cavalo contribuíam para dar a Júlia, uma mulher sempre tão decidida, um ar para mim inédito de menina frágil. Ela me disse que queria demais ter um filho, mas não naquelas circunstâncias. Eu não tentei convencê-la de nada. Não sei se ela esperava que eu procurasse dissuadi-la. Nas poucas conversas posteriores que tivemos sobre o assunto, Júlia nunca se referiu a esse ponto específico.

Tudo que ela parecia esperar de mim era alguma ajuda moral, e o máximo de suporte amoroso. Levei-a à clinica, no dia marcado. Alguns dias depois, já de volta a seu apartamento, Júlia me contou que era um menino. Eu seria cínico se dissesse que o aborto me deixou abalado. Mas estaria mentindo se dissesse que ele representou apenas alívio para mim. O fato é que eu não sabia, naqueles dias, o quanto um aborto pode significar para um homem. Não sabia quanta perplexidade, quanta pergunta sem resposta pode trazer com o correr dos dias. Aquele aborto é uma marca vívida em minha vida. Ainda hoje acho que fizemos o que tínhamos que fazer, mas alguma coisa dentro de mim parece não se satisfazer inteiramente com a explicação lógica e racional para a ida de Júlia à clínica.

Li depois em algum romance – ah, sim, um de John Irving — a expressão fábrica de anjos para designar uma clínica de aborto. Sempre que me lembro do aborto de Júlia, aquela expressão me vem à mente e me traz um sentimento de dúvida. . É uma dúvida incomodamente vã, porque sei que não existe resposta possível para ela nem jamais existirá. Nosso namoro durou pouco mais. Não acredito que tenha terminado por causa do aborto. Cada qual tinha seus projetos. Júlia foi ter o filho que tanto queria com outro homem. Eu segui meu caminho de escritor barato, um solitário caubói barato das letras. Às vezes penso no filho que Júlia, que amei tanto, e eu não tivemos. Como ele seria. Que tipo de ligação manteria com o pai que não teve. Formaríamos uma dupla de tênis? Riríamos ou choraríamos diante de uma vitória ou derrota do nosso time? Traríamos calor um para o outro em momentos de desalento? Eu o veria garboso ao longe e pensaria, orgulhoso, que ali ia o meu menino? Nesses momentos, me vem um incômodo que não é grande senão por me fazer sentir pequeno.

A versão feminina do Manual da Bota: como ela pode saber se ele está prestes a dar um pé (e eventualmente se antecipar)

09/12/2009

A bota sempre pode estar a caminho

A PEDIDOS, faço a lista dos 13 sinais vitais de que ela está na iminência de levar bota dele. A lista anterior era voltada para os homens, predominantemente. Mais uma vez, uma advertência. Caso você tique, isoladamente, um ou outro ponto, isso não quer dizer necessariamente que a bota virá. Pode ser apenas uma má fase. Metade dos itens e a luz já é amarela. Não há nada que se possa fazer em situações amorosas perdidas exceto a) se antecipar e dar você a bota, para salvar o orgulho e a autoestima; b) resignar-se estoicamente como um Sêneca do amor unilateral e voltar a sair com suas amigas; c) movimentar o corpo na direção da trajetória da bota, lepidamente, de forma que o impacto seja o menor possível; entender que, como afirma o budismo, nenhum ser senciente e romântico escapa do sofrimento, a começar pelos provocados pela bota, e portanto temos que seguir adiante rumo a novas botas, sejam elas dadas por nós ou, na hipótese mais sinistra, levadas por nós.

Isto posto, ao trabalho. A bota está a caminho quando:

1) Ele subitamente aceita rachar contas;

2) Em alguns casos, em restaurantes mais caros, sugere que você acerte essa e não se fala mais nisso;

3) Você veste a nova camisola e ele sugere que você coloque o velho pijaminha;

4) Ele desliga o laptop cinco minutos depois de você começar a roncar;

5) Ele emite uma opinião sincera sobre sua mãe;

6) Ele também emite uma opinião sincera sobre o almoço que você preparou;

7) Ele devolve os cds, os livros e os dvds que tomou de você;

8 )  Você pede vinho e ele água com gás no jantar;

9) Ele afirma estar numa fase de alta elevação espiritual quando você fala em sexo;

10) Ele subitamente começa a admitir que a Angelina Jolie é muito gostosa, depois de ter dito sempre na sua frente que ela não era nada daquilo que diziam; pode admitir, em certos casos, que sua irmã também é muito gostosa.

11) Ele diz que você precisa passar a ler o caderno de política porque você está sem conteúdo;

12) Ele sugere que você deve fazer regime; ou concorda caso você traga a questão.

13) Você desabotoa dois botões da camisa e ele avisa que estão desabotoados; ou os abotoa como se fosse seu pai.

Como perceber se ela vai dar levar bota em 14 tópicos (E eventualmente se antecipar)

08/12/2009

OS 14 SINAIS VITAIS de uma bota iminente falam, gritam, esperneiam. Latem, até. E podem dar coice. Você só não os ouve e não os vê se for otimista ao extremo ou se não quiser enxergar, o que é comum em casos de paixão que subitamente se tornam unilaterais.  O conjunto desses sinais é matador como um homem-bomba. Individualmente, os pontos podem não significar, necessariamente, a proximidade da bota. Podem retratar apenas uma má fase do casal, ou uma passageira temporada de dúvida dela em relação a você. Calculo que se você ticar apenas metade dos 14 sinais vitais ainda há alguma esperança, sobretudo se você renovar o guarda-roupa, reforçar a leitura de bons livros e parar de ver vale tudo nas noites de sábado. Mais da metade e só um milagre. O que você pode fazer, nessas situações, é se antecipar e salvar a honra, se isso fizer bem a você.

A lista:

1) Ela não ri mais de suas piadas;

2) Nomes masculinos aparecem nas conversas com muito maior frequência, e a maioria você jamais ouvira;

3) As opiniões dela sobre sua mãe mudaram de uns tempos para cá, e não para melhor;

4) Você tem que ligar de um número desconhecido porque do seu celular está difícil ela atender;

5) Quando toca o celular dela, ela pede licença e vai atender longe, dizendo que é uma amiga;

6) Ela discorda de você mesmo quando você diz que o tempo está feio num dia frio e chuvoso;

7) Ela pede para você escovar os dentes antes do sexo e até durante;

8 ) Ela dá um unfollow súbito em você no twitter e diz que não consegue seguir tanta gente;

9) Nos primeiros 30 minutos da conversa ela consulta o relógio três vezes ou mais;

10) Ela diz que precisa ter uma conversa, mas não especifica;

11) As enxaquecas coincidem com as oportunidades de sexo;

12) Você fala em planos e ela muda de assunto;

13) Enquanto conversa com você ela está atualizando o Facebook;

14) Ela pede de volta os livros, dvds e cds, e devolve os seus sem que você os peça.

Quer saber se ela quer sexo com você? Olhe os pés

07/12/2009

OS MANUAIS de etiqueta dizem que você deve olhar nos olhos de uma mulher na conversa, não no decote ou em qualquer outro ponto. Mas não é assim, com bons modos, que você vai saber se ela tem interesse sexual por você.  Observe os pés e você saberá se ela quer mais que um papo com você, segundo um novo e mundialmente comentado estudo feito por um psicólogo que dá aula na Universidade de Manchester, na Inglaterra. Centenas de pezinhos femininos foram examinados na pesquisa durante um bom tempo.

Para resumir. O sorriso é ambíguo e difícil de decifrar. Ela pode estar rindo de você, por exemplo. Pode também estar dando um sorriso protocolar, ou fingido.  Outros gestos corporais podem ser também artificiais, e não legítimos. Mas os pés, segundo o psicólogo, não mentem jamais. Pela potente razão de que a maior parte do tempo não os controlamos como a outros órgãos.

Funciona assim, segundo o estudo: quando ela está a fim de, na linguagem grosseira e inaceitável do Cafa, ser finalizada, os pés se afastam ligeiramente de tal forma que as pernas ficam mais abertas. Se ela cruzar as pernas, má notícia, amigo.  Pernas cruzadas e apertadas, então, é que ela tem aversão por você. Estando num bar ou restaurante, rache a conta, nestes casos, ou diga que esqueceu a carteira, porque não fará diferença. A pesquisa foi feita por um dos mais renomados psicólogos britânicos, Geoff Beattie. Você pode ouvir sua explicação numa entrevista que deu a uma rádio inglesa, se quiser.

Não me lembro, olhando para  trás. de ter reparado nisso, em nenhuma situação romântica em que me envolvi. Reparei, a maior parte das vezes, nos olhos arregalados, luminosos, que quase sempre tomei por sinceros, ou em gestos mais concretos, como um telefonema, para não falar em ações menos sutis dos pezinhos 35/36, como um chute na canela debaixo da mesa.

Mas, quando a ciência fala, quando a razão se pronuncia amparada em pesquisas feitas em universidades respeitadas, é mais sensato que as vozes da emoção primitiva, como a minha, se recolham a um silêncio que, para ser franco, também é difícil de decifrar. Talvez revele respeito, talvez esconda uma gargalhada de escárnio.

Por que os homens traem as gostosas?

05/12/2009

Mesmo loiras como essa de Tom Wesselman não estão isentas de traições

SEI LÁ. Às vezes acho que as revistas feministas vivem numa dimensão paralela. Outro dia, por exemplo. Eu estava navegando ao acaso, como um veleiro perdido na imensidão azul, quando vi na tela de meu laptop meia-boca um artigo da Cosmopolitan, a Cosmo, americana, a mãe de todas as revistas para a mulher supostamente moderna.

Era em cima da história do Tiger Woods, o sexualmente voraz jogador de golfe, como se viu, apesar da cara de santo, da expressão de quase bobo. Parecia um MP, Marido Perfeito. “É curioso”, gostava de dizer Tio Fabio, falecido homem sábio do interior, Deus o tenha. “Elas confiam nos homens com cara de bonzinho quando eles são, exatamente, os mais perigosos. Tudo neles é fajuto e hipócrita, e a expressão de santo mais que tudo.” Segundo Tio Fabio,  nem o Belzebu sabe o mal que se esconde no coração dos santinhos, tamanha a dissimulação cínica deles.

A Cosmo pareceu de fato espantada com a revelação de que Tiger Woods traiu sua mulher e não apenas uma só vez. Prevaricou um bocado.  A enganada é uma loira bonita, bem tratada e bem vestida, aquele tipo que nosso amigo Cafa definiria grosseiramente, numa palavra, olhos arregalados fixos no decote, como gostosa.  Veio daí a perplexidade da revista. Como se houvesse uma regra segundo a qual mulheres com determinadas medidas estariam imunes a ser passadas para trás. O título mostrava essa ingenuidade colossal.  Era assim, literalmente: “Por que os homens enganam as gostosas?”

Minha lista curta de respostas possíveis:

1) porque podem ser arrogantes devido à beleza;

2) porque podem ser, simplesmente, ruins de cama;

3) porque talvez não se empenhem o suficiente por achar que traços bonitos resolvem tudo;

4) porque podem ser egoístas e querer fazer apenas as coisas que as agradam, como se o homem fosse um escravo;

5) porque para não engordar comem muito pouco e, por isso, podem ficar com o hálito azedo.

Deu?

Um amigo meu fotógrafo brasileiro que vive na Argentina namorou, certa vez, uma atriz de novela de uma televisão que aparecia sempre na Holá!, a Caras deles.  Quando eu soube, perguntei a ele como era esse namoro. “Já dei bota”, ele me avisou. “Uma negação na cama.” Ele me contou que, por um momento, chegara a pensar que o problema estava nele, mas uma noite com outra mulher, menos gostosa, provou-lhe que não era assim. Ela era a questão.

Há um erro básico que as pessoas frequentemente cometem. Uma mulher sensual, por exemplo. Ela  não se define pelas curvas, mas, como diz a palavra, pela volúpia, pela intensidade dos seus sentidos. Pela maneira como ela gosta de tocar, sentir, cheirar o seu homem.

Essas, não digo que não sejam traídas, tão instável e cruel é o universo com suas tentações que chegam aos inocentes na alma como raio em céu azul. Mas é mais difícil. O homem pensa uma, duas, várias vezes antes de dar um passo que possa colocar em risco uma mulher que o trata na cama como ele merece. Na maior parte das vezes, demora tanto pensando que a tentação passa.

Eis a mulher de fato gostosa. Não se define pelos cabelos, não se define pelo decote, não se define pelos contornos, não se define pelo peso.

É uma questão de atitude. Isso a Cosmo deu a impressão de não saber no artigo tolo sobre a traição em série de Tiger Woods.

Filmes e livros quentes: minhas listas curtas

03/12/2009

Obra de Schiele

Uma obra de Schiele

MINHA LISTA CURTA de filmes que você não vê sem ficar com certas idéias na cabeça:

1) Decameron, Pasolini. Se você acha que o sexo é uma invenção nova, dê uma olhada em como as coisas eram na Idade Média.

2) História de O, de Justin Jaeckin. Corinne Clery é uma deusa neste clássico da submissão.

3) Emanuelle, de Justin Jaeckin. Silvia Krystel parecia ter nascido para ser possuída. A cena em que uma admiradora de Paul Newman se acaricia numa cadeira de balanço enquanto conversa com Emanuelle é cultuada.

4) Império dos Sentidos, de Mishima. Raras vezes alguém mostrou tão bem o quanto o sexo torrencial pode estar associado ao desespero.

5) Os Sonhadores, de Bertolucci. Em 1968, os estudantes franceses não estavam interessados apenas em fazer a revolución.

AGORA MINHA LISTA CURTA de livros que ao ler seu coração pode palpitar:

1) Relações Perigosas, de Choderlos de Laclos. Um romance feito à base de troca de cartas  mostra como se pode manipular uma jovem inocente na corte francesa pré-Revolução.

2) Decameron, de Bocaccio. Leia filme 1.

3) História de O, de Pauline Réage. Leia filme 2.

4) Delta de Vênus, de Anais Nin. A delicadeza feminina no erotismo.

5) O Animal Agonizante, de Philip Roth. O velho tema professor-aluna revisitado por um mestre.

Caso tome uma bota, lembre sempre dos defeitos de quem a desferiu em você

01/12/2009

PERA, CALMA. Uma fêmea nervosa, aflita, não encontra resposta para um dos dramas mais cruéis da humanidade no capítulo amoroso. Ela assina uma carta com uma identidade misteriosa, M. Srta M, chamemos assim a missivista. É um lamento, um gemido, uma angústia que jorra incontrolada de sua alma desiludida de moça sonhadora: por que, cargas d’água, a gente só se lembra das coisas boas depois do adeus?

Normalmente eu suprimiria as cargas d’água, por ser uma expressão gasta, mas ali, da maneira que a Srta M a colocou, o velho clichê ganhou uma força nova, um vigor juvenil. Mantive-o, então.

A interrogação desesperada da Srta M é sinal de que provavelmente neste  instante ela  lamenta um amor perdido que em sua memória é belo como um poema de Bandeira e ensolarado como um dia de dezembro na Vila Mar, ali pertinho do Bira’s Bar,  onde passei os verões deslumbrantemente fugidios da adolescência.

Imagino a Srta M, braços elevados para os céus, os olhos úmidos, buscando uma resposta para um dos caprichos do amor que mais nos machucam: a sensação torturante, cruel como um cossaco russo e ríspida como um cigano búlgaro, de que perdemos de bobeira, por desleixo, algo que não soubemos valorizar e cuidar quando podíamos e devíamos.

Mas não dos céus, e sim da caixa de comentários, aparece uma resposta científica, objetiva, neurológica, quase que completamente inatacável. Anarcoplayba traz a luz da ciência e da razão onde antes havia a treva da emoção e da dor. Acode a Srta M com a voz da medicina. Um amigo médico lhe contou tudo.

Copio e colo, por mérito do autor:

As boas recordações são neurologicamente mais estáveis que as más recordações.

Ou seja, enquanto as coisas boas ficam ecoando na sua cabeça, as ruins vão “fading out”, ficando borradas, apagando, sumindo.

Não é que você “só lembra das coisas boas depois que acaba”, é que você, enquanto está próxima dos eventos, está num turbilhão de sentimentos bons e ruins. Quando a história acaba, os ruins vão sumindo e os bons ficam. Daí a ilusão de que “não era tão ruim assim”.

Era, mas você esqueceu.”

Graças a essa explicação, Anarco conta que evitou o risco de voltar para um amor mofado. Recolheu suas coisas no dia seguinte à ruptura, antes que fosse vítima do ritmo desigual das recordações.

Cética quase que no limite da descrença, ligeiramente mordaz como quem zomba elogiando, Karina questionou a neurologia do fracasso amoroso e se estabeleceu, então, um bonito duelo de palavras, argumentos e idéias. Encarnavam os dois o antigo combate entre a razão e a emoção. Rafa, provavelmente no intento de apagar memórias afetivas doídas, pediu prontamente mais informações, e recebeu-as de Anarco. Terminaram a conversa com promessas,  Anarco de trazer ainda mais ciência, Rafa de ir à Academia do Google, que eu não sabia existir. Karina, depois de quase proferir o hahaha ignominioso do Cafa, o que finaliza e some, se recolheu.

Quanto a mim.

Sempre terminei, sem conhecer a explicação científica que a neurologia ao que tudo indica oferece, vendo o passado sob lentes que evidentemente o tornavam mais azul do que era. A dor da despedida, assim, não raro ardeu em mim como as lenhas da inquisição, e se muitas vezes eu não gritei foi por autocontrole estóico e não por falta de vontade.

Até o dia em que li um sábio da Antiguidade.

Ele dava um conselho básico no amor perdido: fazer a lista dos defeitos de quem deu uma bota em você e olhá-la uma, duas, quantas vezes for necessário. Relembrar, nos detalhes sádicos, as agressões, as palavras ruins, as noites perdidas por conta das brigas. Mentalizar, para usar a terminologia neurológica, a mesquinharia, a patifaria, as mentiras, todas as decepções que levaram a relação ao crematório da Vila Alpina.

Pode demorar um pouco, mas esse método, se seguido disciplinadamente, neutraliza a explicação científica tão bem anotada por Anarco: a permanência teimosa das boas lembranças e o apagamento quase que instantâneo das más.

Foi ruim, e por isso acabou. Foi mais que ruim. Foi péssimo, um pesadelo. Ponto. Por isso acabou. Sorte sua.