“Gosta do Miller?”, disse ele.
“Hmmm?”, disse ela.
“O Henry. Henry Miller.”
“Li algumas coisas dele. Muito sexo. Fiquei enjoada. Um puta machista.”
“Meu. Sei lá por quê. Adoro o cara. A prosa rápida, irreverente, audaciosa. As frases provocativas. Minha predileta: estou quebrado, sem planos, sem rumo, e sou o cara mais feliz do mundo. Tá no Trópico de Câncer.”
“Vontade de rir. O cara ficou rico. Riquíssimo. Quebrado? Só na literatura, pra impressionar as meninas que ele comia. Que eram muito mais novas. Tipo Berlusconi.”
“Tudo bem. No final da vida ele já tava consagrado. É verdade. Pô, mas ele escreveu pornografia pra sobreviver. Vendia para um interessado em erotismo, você sabe. Um dólar a página. Ele era um escritor barato. Como eu. Lol.”
“Quer parar com essa história de lol, por favor?”
“O Miller era louco pelo Gurdjieff. Falava dele de olhos arregalados, mesmo quando já era velho.”
“Hmmm?”
“O Gurdjeiff. Um cara meio guru do começo do século XX. Escreveu um livro chamado Encontro com Homens Notáveis, um clássico obscuro. Li uma vez. Ia ler uma segunda, mas sei lá.”
“Você lê muita coisa ruim. Fico impressionada.”
“Não leio a mim mesmo. Já é um começo. Lol.”
“Não vai parar com esse lol? Levanto e vou embora. Sério.”
“O Hitchens escreveu que as mulheres não têm senso de humor. Discordo. Acho vocês bem mais divertidas que os homens.”
“O Hitchens? Outro machista. Putz. Ele tá barrigudo pra caramba. Obesos consomem mais gás carbônico. Sabia?”
“Não. Voltando. Queria ver o Hitchens escrevendo sobre o Berlusconi.”
“Dois trogloditas, cada um do seu jeito. Um do tipo intelectual, outro do tipo folclórico. Fico admirada que eles façam sucesso.”
“O Saramago deu um cacete no Berlusconi. Chamou ele de coisa.”
“Não gosto do Berlusconi, você sabe. Mas sou mais ele que o Saramago. Putz, alguém devia impedir o cara de escrever. Ele conseguiu destruir até o pobre Jesus num livro sobre ele.”
“Lol.”
“Quer parar, homem?!”
“O Berlusconi e aquelas meninas. Acho que os caras que descem o pau têm uma certa inveja dele. Aos 72 fazer o que ele faz. O Saramago não deve pegar ninguém há muito tempo. Olha. Você consegue imaginar o Saramago transando?”
“Francamente? Acho que o cara deve ser um fenômeno na cama. Os melhores fornecedores de orgasmo para as mulheres são os tipos mais improváveis.”
“Repete. Essa frase eu vou guardar.”
“Já esqueci.”
“Lol.”
“Pára, homem. Esse lol é ridículo.”
“Vou tentar refazer a frase. Os melhores fornecedores de orgasmo são os tipos mais improváveis. É isso?”
“Sei lá.”
“O Berlus …”
“A melhor coisa que li dele foi de uma jornalista inglesa”, ela cortou. “Ela disse que ele não dava mostra de virilidade ou de potência pegando menininhas a troco de muito ouro, mas de total falta de controle.”
“Lol.”
“Chega de lol!”, ela elevou a voz.
“Viu as fotos que o El País deu?”
“Eu não perderia meu tempo com isso, sou ocupada.”
“Aquele Mirek sei-lá-o-quê, o tcheco.”
“Tcheco só conheço o Mucha e o Kafka. E o Kundera. E é o suficiente.”
“Esse Mirek. Tava com o que eles chamam de ‘estado de excitação’.”
“Aposto que o pênis dele é pequeno. Nem vi e não vou ver. Mas aposto.”
“Não medi.”
“Caras como ele e o Berlusconi. São muito óbvios. Não são fornecedores de orgasmo.”
“Lol.”
“Sai já dá minha cama, escritor barato e repetitivo! Essa história de lol tá me deixando louca. Eu nunca berrei desse jeito com ninguém, entendeu?”
“Lol.”