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Os conselhos de acompanhante Belle de Jour para que a mulher tenha uma vida sexual feliz

13/05/2011

ESCRITOR BARATO LÊ escritora barata. Há uma certa camaradagem entre nós, os esforçados soldados rasos das letras, os transpolins anônimos para Dostoievski, Tolstoi e Flaubert. Por isso peguei para ler o segundo livro da Belle de Jour, a cientista gostosa e quente que, para pagar um doutorado de mais ou menos 300 000 reais, fez durante 14 meses, entre 2003 e 2004, acompanhante df em Londres. Quase 1 000 reais a saída.

É um livro divertido, muito mais cômico e irônico do que erótico. Você mais ri que fica excitado, com certeza. É um erro grosseiro dizer que Belle de Jour, ou Brooke Magnanti, glamurizou a prostituição.  É o oposto. Ela tira todo o peso, toda a seriedade, toda a solenidade da vida de garotas de programa bsb. E também a lamúria, a autppiedade. Como sugeriram grandes filósofos, entre os quais Sêneca e Montaigne, ela ri da miséria humana, em vez de chorar.

Bem, ela entremeia seus relatos com listas e conselhos espirituosos para uma vida afetiva e sexual saudável e prazerosa. Não tem o tom doutoral e mofado das revistas femininas, mas sim a vivacidade petulante de quem sabe muito sobre sexo com lindas garotas e quer repartir, generosamente, com quem sabe pouco ou nada.

Me chamaram a atenção duas recomendações que ela faz, às leitoras, para tirar o sexo de uma eventual situação de tédio. Gostaria de ouvi-los, turma. A primeira: conversar abertamente com as amigas sobre sexo. Pode ser libertador e inspirador, segundo Belle. Boas práticas sexuais podem ser trocadas. Alguma coisa que alguém fez ou faz pode ter bons resultados para você na, como Tio Fabio dizia, fornicação.

A outra recomendação é: vejam pornografia, meninas. “Ao contrário da lenda, a mulher pode subir às alturas com um bom filme pornô”, diz ela, numa tradução livre. “Há situações interessantes e instrutivas.” Admito que sempre acreditei nessa tese, a de que mulher é avessa à pornografia. Meu limite pessoal foi a História de O e O Império dos Sentidos, que não chegam a ser pornografia.

Belle de Jour, com sua franqueza desconcertante, desmonta a questão da indiferença feminina ao sexo kinky do cinema pornográfico. A única mulher realmente entretida com erotismo que conheci foi Anais Nin, uma excelente escritora que nos anos 30, com seu jeitinho suave, chacoalhou Paris com seu amigo e amante Henry Miller, o autor de Trópico de Capricórnio. Anais, de quem recomendo qualquer volume de contos, escrevia histórias tórridas para um colecionador de erotismo a 1 dólar a página. Substituiu, aí, Henry Miller, e não raro escrevia na cama, caneta e caderninho, ao lado do marido bancário adormecido. A parceria entre Henry Miller e Anais Nin se transformou num filme muito bom, Henry & June.

Bem, ao debate sobre os pontos levantados por Belle de Jour.

Sou mais a cientista que fazia programa do que a entrevistadora

26/11/2009

Belle de Jour, numa foto publicada pelo site do Daily Telegraph

“POR QUE VOCÊ decidiu escrever?”, pergunta a loira de baixo para a loira de cima. Há um tom de reprovação na pergunta, expresso no semblante carregado da mulher que a fez. Era a primeira entrevista de Belle de Jour, a cientista que para pagar seu doutorado decidiu ser, como ela diz, ‘trabalhadora do sexo’, ou marafona, como Tio Fabio gostava de falar com um sorriso. (Abra o link acima, recomendo.)  Enfim, uma prostituta, e de luxo, em Londres, uma mulher bonita, culta e divertida que você só poderia desfrutar se pagasse 300 libras a hora, e isso num período de 14 meses entre 2003 e 2004.  Tão logo arrumou seu novo emprego, ela começou a escrever um blog, que fez um sucesso imediato, e no qual narrava suas aventuras sexuais secretas. Era, e é, tão bem escrito que as pessoas desconfiavam se tratar de um profissional das letras. Dois livros vieram do blogue, e mais uma série de tevê.

Com o título de doutora conquistado, e também com o ponteiro do relógio avançando, e posto que passou dos 30 uma escorte é titia, ela deixou de ser garota de programa e retomou a carreira científica. Revelou a identidade secreta porque um ex-namorado ameaçava falar. Imagino que estivesse chantageando-a. O caso teve repercussão transatlântica, e aquela era a primeira vez que Belle ou Brooke falava com a mídia depois da confissão.

Isso tudo colocado, faz sentido a pergunta da entrevistadora? Ora, Brooke começou a escrever porque tem uma imensa vocação literária. Vi textos de seu blogue, e estou lendo seu segundo livro, e é uma prosa de alta qualidade.  Tão boa que sequer parece ser o que é, a rotina de uma ‘trabalhadora do sexo’ que, ao contrário do que se vê no cinema, não tem por clientes apenas galãs. O lado degradante, que evidentemente existe na prostituição, é atenuado nos textos de Belle por um humor elegante e jovial que faz você rir quando poderia ficar chocado.

A entrevistadora parece cobrar arrependimento de Brooke e ficar desapontada quando ela diz que fez o que achava que tinha que fazer, sem remorsos. Diz ainda, sem afetação, que sente alguma falta de determinados aspectos da sua vida passada. A emoção, por exemplo, de chegar a um hotel para um encontro marcado, sabendo que terá que trabalhar bem, ter um bom desempenho, seja isso o que for.

Sou muito mais Brooke que a entrevistadora arrogante, severa, toda produzida e engomada, uma Barbie de toga que se dá ares de juíza e gostaria que os espectadores levassem a sério seus vereditos impiedosos.

São duas mulheres frente a frente, uma entrevistando e julgando, a outra respondendo com graça. Uma parece pesada em seu papel inquisitivo, a outra leve, suave, alguém que não se autoflagela por ter feito o que fez. Uma deve dormir mal e acordar mal, a outra dormir leve e acordar mais leve ainda.

Não quero ser juiz, e acho a prostituição um horror, naturalmente, mas se tivesse que escolher entre as duas loiras não faria como Pôncio Pilatos. Não lavaria as mãos. Optaria, sem dúvida, por Belle de Jour.

A entrevistadora, numa foto publicada no Daily Mail