O Amor é ingrato


Meu tio Fabio, um homem sábio do interior, um dia me entregou um livro do Plutarco. Confesso que tremi diante da idéia de enfrentar, na inexpugnável solidão da leitura, as páginas com certeza brilhantes mas inevitavelmente árduas do grego. Mas, prático que é, e conhecedor das limitações de seu sobrinho como leitor, tio Fabio me avisou que desejava que eu lesse somente um trecho marcado numa determinada página.

Ali se contava a história de um soldado que salvara a vida de um rei numa batalha. Um sábio imediatamente aconselhou o soldado a fugir. O soldado preferiu ficar, na esperança de ser recompensado pelo rei que salvara. Acabou morto. E logo. Quando terminei de ler essa história, imediatamente me lembrei de outro trecho de livro que tio Fabio me passara. Platão – tio Fábio sempre bebeu na sabedoria grega – contava que Sócrates disse mais ou menos o seguinte aos homens que o condenaram a tomar cicuta: que bem fiz eu a vocês para que me tratem assim?

As duas histórias tratam do mesmo tema: a ingratidão. E francamente: não sei por que iniciei minha coluna com a dupla história grega de ingratidão humana. Ou melhor. Sei sim. É que eu queria fazer uma conexão entre aqueles episódios e a vida amorosa. O fato cruel e inescapável é o seguinte: o amor é ingrato. O amor tem uma série de virtude: ele ilumina, ele embeleza a vida, ele torna divertido um congestionamento. Mas ele é ingrato como o rei que matou o soldado que o salvara e os atenienses que fizeram Sócrates beber cicuta.

Um amigo meu, Roni, outro dia veio desabafar comigo. Ele acabara de romper com a namorada, uma loira de fazer bispo chutar o poste, e ela além de gritar-lhe insultos arrebentou a pontapés a porta de seu carro. Roni é essencialmente um ingênuo do amor, um otimista das relações sentimentais. Ela sinceramente achava que, por fatos como ter arrumado um bom emprego para a namorada e num período de depressão ter-lhe até financiado um terapeuta de 120 reais a hora, receberia de volta alguma gratidão, e não uma porta de carro arrebentada a golpes de salto alto.

Tive vontade de apresentar Roni a tio Fabio e pedir a ele (meu tio) que falasse um pouco a meu amigo sobre a gratidão humana. Tive vontade de falar um pouco do soldado e de Sócrates, do rei assassino e da cicuta. Mas apenas balancei a cabeça numa muda expressão de solidariedade a meu amigo ferido na alma e no carro. Roni, refleti, passará a vida inteira atrás de uma ilusão, de uma fantasia tão irreal quanto a espada de Arthur: a gratidão amorosa. O que você possa ter feito de bom a alguém numa relação amorosa não conta no final. O que vale são apenas os crimes, geralmente imaginários, que você cometeu. Não conheço caso de amor que termine com uma declaração sincera de agradecimento pelos serviços prestados.

Roni me contou, em sua estupefação tola, que até em relação ao sexo ouviu palavras que quase o reduzem a um eunuco da corte de Ramsés. “E ela vivia me agradecendo por tê-la ensinado a ter orgasmo com penetração”, me repetia ele. “No final me disse que eu não tinha nenhuma imaginação quanto a sexo. Que eu era um idiota sexual.” O meu ponto é o seguinte: faça sempre tudo que puder por sua namorada, mulher, amante. Tudo. Agrade-a de todas as maneiras possíveis. Flores, beijos, bom sexo, atenção. Dê tudo. Mas jamais cometa o erro fatal do soldado. Não faça nada esperando gratidão. O amor é ingrato como o rei que matou o homem que o salvara da morte.

38 Respostas to “O Amor é ingrato”

  1. Anónimo Says:

    é mesmo. o amor é ingrato. todos foram comigo…

  2. Leonardo Lima Says:

    Boa!
    Começei a pensar de forma similar depois de algumas decepções.
    Me fez viver de modo mais saudável, porém, penso que seja mais um passo em direção ao egocentrismo irritante o qual todos dizem estarmos caminhando.

    Paradoxo.

  3. Julia Says:

    Ninguém termina um caso de amor agradecendo pelos serviços prestados. E ninguém do outro lado fala: “atendemos bem para atender sempre”.

    Meu (às vezes) sábio irmão fala que ingratidão é o pior sentimento que alguém pode ter por outra pessoa. Ele tem razão. Você também, Fabio. O amor é ingrato.

  4. Xexéu Says:

    Espetacular … Traz a tona questões não só amorosas, que também me faz refletir sobre amigos e traição, que para mim é a versão da ingratidão, só que aplicada a amizades

  5. Ricardo Steil Says:

    Como Paula Toller uma vez cantou: “Talvez eu tenha ganho, mais do que eu tenha dado, mas contas de amor sempre dão errado”. Em resumo, no fim de todo o romance, esquecemos os momentos bons, e o quanto crescemos ao lado de quem amamos, e só lembramos do que houve de pior.

  6. PequenAprendiz Says:

    Tenho lá as minhas dúvidas a respeito dessa ingratidão… será mesmo? Particularmente, não concordo. Algumas pessoas nos elevam, nos fazem crescer, nos transformam para melhor. Acha que essas mudanças tão fortes na vida de alguém esquecessem assim? Eu não.

  7. PequenAprendiz Says:

    Tenho lá as minhas dúvidas a respeito dessa ingratidão… será mesmo? Particularmente, não concordo. Algumas pessoas nos elevam, nos fazem crescer, nos transformam para melhor. Acha que essas mudanças tão fortes na vida de alguém esquecessem assim? Eu não.

  8. Anónimo Says:

    podemos,realmente, agradecer por serviços prestados mas amor não é isso!
    Ingrato aquele que vive de fantasia iludindo o outro.sabe-se lá o que Roni aprontou.

  9. Anónimo Says:

    podemos,realmente, agradecer por serviços prestados mas amor não é isso!
    Ingrato aquele que vive de fantasia iludindo o outro.sabe-se lá o que Roni aprontou.

  10. Neyde Says:

    Meu alter ego…
    Quanta ilusão!!!!….risível.
    Mas…gostei de receber a sua visita.

  11. Araceli Says:

    É mesmo. N espere nda d bom em troca.

  12. Araceli Says:

    É mesmo. N espere nda d bom em troca.

  13. Anónimo Says:

    Pela primeira vez li Fabio Fernandez e adorei.Mesmo sem receber nada em troca o amor ainda continua sendo.

  14. Says:

    O certo é não esperar nada em troca dos outros. Aqui sempre se fala daqueles amores que terminam em brigas, mentiras, traição. Mas e aquele tipo de amor (se é que isso é amor) que termina sem despedidas, palavras e só o que se tem é a saudade, boas lembranças, nunca uma briga, desconfianças, nada!!!! Acho que assim é pior, não sei. Porque sempre haverá um fio de esperança junto com o sofrimento.

  15. Anónimo Says:

    Muito bom ese texto,do fábio H.,o amor como alguns amigos, é na sua maioria muito ingrato.Quando se termina uma relação, voçê sempre é pintado de monstro.

  16. Anónimo Says:

    o q eu gostaria de entender,é o que as pessoas esperam q se agradeça no final de uma relação.será q agora momentos intimos ou de amor são confundidos com serviços q se presta ao outro?virou comércio?ou o que? tudo bem…levamos algo em troca depois de um caso de amor ,quer seja bom ou ruim ,não importa mas agradecimentos a que?se uma relação termina nem sempre épq tinha q acabar como acabou por isso ficam as lacunas, inclusive as que nos levam ás atitudes ditas monstruosas.mas daí a achar que devemos agradecer por amar ou ser amado ,não concordo.cada caso tem suas razões para terminar da maneira q termina e não requer agradecimentos.pode parecer narcisico mas devemos ter gratidão é por nós mesmos por motivos próprios que nos levaram a tal relação ou a tais atitudes.ingenuidade achar q um caso de amor verdadeiro possa acabar numa boa,até acontece,mas só qd ninguém sai ferido de lado nenhum,qd a coisa se esgota e não faz mais nenhum sentido para os dois,e isso é muito raro.A acomodação existe!

  17. Bada Says:

    como eu sempre digo pra minha querida irmã, a ingratidão deveria ser pecado capital.
    sensacional esse texto, a parte da declaração me deixou emocionado

  18. barbara Says:

    jah nao acrefito mais q o amor exista….mas nunca vou desacreditar na boa vontade de uma paixão!!!tudo o q faz um apaixonado vale a pena,mesmo q a outra pessoa nao de valor!!!!
    portanto n importa se receberemos gratidao,o importante eh o aprendizado afinal,o melhor caminho eh aquele q escolhemos….

  19. barbara Says:

    jah nao acrefito mais q o amor exista….mas nunca vou desacreditar na boa vontade de uma paixão!!!tudo o q faz um apaixonado vale a pena,mesmo q a outra pessoa nao de valor!!!!
    portanto n importa se receberemos gratidao,o importante eh o aprendizado afinal,o melhor caminho eh aquele q escolhemos….

  20. Anónimo Says:

    Sensacional… é exatamente isto que acontece. O amor pode até terminar, mas a gratidão, esta, jamais começa. triste. adorei o texto.

  21. Anónimo Says:

    Igratidão é crime que deveria ser punido com pena de morte.

  22. Suzana Paula Says:

    Tudo é muito relativo. O problema é que esperamos ficar sempre com aquela pessoa por quem demos tanto, e quando acaba e não é nossa culpa achamos que não fomos reconhecidos por quem ainda amamos.
    Estou passando por isso e me sinto exatamente assim… sei que é errado pensar assim, mas gostaria de um reconhecimento maior. Que ele pensasse em tudo que vivemos juntos e as coisas que fiz por ele e visse que poderíamos dar certo.

  23. Anónimo Says:

    Minha mamy sempre me fala,meu amor!faça o que tiver que fazer,faça o seu melhor,porquer quer,Não espere que a outra parte faça o mesmo,mais quem pode dizer que alguma separação tem a cor rosa??
    Uma separação seja como for a cor é cinza,só isso que eu teno pra dizer:

  24. Anónimo Says:

    Minha mamy sempre me fala,meu amor!faça o que tiver que fazer,faça o seu melhor,porquer quer,Não espere que a outra parte faça o mesmo,mais quem pode dizer que alguma separação tem a cor rosa??
    Uma separação seja como for a cor é cinza,só isso que eu teno pra dizer:

  25. valéria Says:

    Falar em ingratidão é o mesmo que dizer : “ainda te amo”. Quando tudo acaba mesmo (mesmo!), a gente nem lembra. Ou melhor, lembra, mas não se emociona. Nem se tivesse levado um chute de salto na própria canela…

  26. Gisele Says:

    O amor não é ingrato. Ingratas são as pessoas. De fato, é difícil achar uma pessoa emocionalmente madura…mas não impossível…

  27. luciana Says:

    Nossa… nem sei como eu fui descobrir esse blog… estava dando uma olhada nos meus sites favoritos e vi que havia esse endereço… não me lembrava do porquê de tê-lo adicionado… mas na verdade nada acontece por acaso…em tudo há sincronicidade… e por hoje estar vivendo uma realidade alternativa… posso dizer que o amor tem um quê de ingrato… mas isso não faz parte de sua essência…e sim isso está presente é na natureza da paixão…

    Apesar de tudo isso…
    Não podemos viver sem esses sentimentos…fazer o que?

  28. João Pedro Says:

    Não só no amor, como no trabalho, na amizade, enfim, em tudo que fazemos, não devemos esperar gratidão, mas temos que ter o coração grande para com todos.

  29. Anónimo Says:

    Não espero gratidão nem tenho gratidão, a única coisa que tenho é vontade de fazer um sexo “maravilhoso” com essa infeliz e depois deixá-la… pra relembrar os velhos tempos

  30. Anónimo Says:

    O amor…engraçado quando a relação acaba…vc de repente se vê machucando, magoando, devastando o outro (ou sendo machucado, magoado, devastado). O tempo passa, a dor se vai, mas não cura, fica ali aquela nódoa, a cicatriz.Vc vira outra pessoa.Escaldado, desconfiado…o pior? É vc refletri que um dia vc amou profundamente aquela pessoa. E ao final, o que restou foi mágoa.E a falat de consideração,a ingratidão, claro.

  31. Anónimo Says:

    O amor…engraçado quando a relação acaba…vc de repente se vê machucando, magoando, devastando o outro (ou sendo machucado, magoado, devastado). O tempo passa, a dor se vai, mas não cura, fica ali aquela nódoa, a cicatriz.Vc vira outra pessoa.Escaldado, desconfiado…o pior? É vc refletri que um dia vc amou profundamente aquela pessoa. E ao final, o que restou foi mágoa.E a falat de consideração,a ingratidão, claro.

  32. guigo Says:

    caro fabio….a ingratidão é foda….mas a ingenuidade é muito pior.

  33. Anónimo Says:

    o amor, ealgo que senpre vem seguido de ingratidao

  34. Gilson Says:

    Brilhante. Aliás o amor é simplesmente o desejo inconsciente de se perpetuar. Se acaba é pq o processo não levaria a nada. Penso que é daí que vem a crueldade do amor.

  35. célia Lins Says:

    eu fui vitima da ingratidão, arrumei um namorado que estava passando por uma fase dificil da vida dele, tanto espiritualmente como financeiramente, fiz tudo por ele, ajudei ele a se levantar do chão, lhe dei casa, comida, roupa lavada, carinho e muito amor. no fim das contas ele me abandonou como se eu nao existisse, trocou de celular e mudou de endereço. eita isso é que é ser ingrato.

  36. célia Lins Says:

    esse sujeitinho, que eu tanto amei, me humilhou, e por causa dele quase que eu faço uma loucura contra mim mesmo.

    • Fabio Hernandez Says:

      Célia, diga não à auto-piedade e siga adiante. Enquanto você ficar obcecada com o cara que te deu bota, sua vida vai ficar estagnada.
      Bota se dá, bota se leva: isso é a vida.

  37. Anonimo Says:

    Hum.. o amor não é ingrato! a gente tende a desconcertar e ser ingrato com o amor. Ingrato é o individuo que desconhece o amor! pensa que ama, mas no fundo o que sente é vaidade, ou orgulho, ou qualquer outra coisa, mas amor… ah o amor, é de uma generosidade sem tamanho! Poucos amam com a propriedade da palavra, poucos reconhecem… o amor não se envaidece (a vaidade sim), o amor nada quer em troca (o egoísmo sim), o amor tudo suporta (o orgulho que não).

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